Ponte

E de repente, à minha frente naquele caminho estreito e sombrio apareceu a ponte. A ponte para a outra margem, daquele rio que me servia de fronteira mas que me podia levar a ti. Parei, inspecionei cada ponto fraco, cada pilar de sustentação, cada proteção lateral, medi a longitude, tentei abanar a sua estrutura, no entanto tudo me parecia perfeito. Agora só faltava meter os pés ao caminho e atravessar, de certeza, que do outro lado, estavas lá tu à minha espera.

Mas porquê tanto medo, tanta hesitação…eu já tinha passado aquela ponte tanta vez. Pensei melhor…voltei a hesitar. Estava tudo tão bem… - passa mulher, para o outro lado, que a felicidade está à tua espera, dizia eu para mim próprio. Contudo qualquer coisa dentro de mim, um sexto ou sétimo sentido me continuava a avisar…e, eu, voltava atrás, hesitava, pensava… Que coisa! Eu não era nada assim, nem era destas coisas, porque geralmente, até me atirava de cabeça desafiando todos os perigos.

Entretanto fui revivendo a minha vida, cada pedaço dela, partilhado ou vivido intensamente, quase sempre nos limites e salpicados de pequenas loucuras cometidas sem pensar, sem hesitar. As dúvidas assaltavam-me a cada minuto que passava e eu não percebia ou não era capaz de entender o que estava por trás de tudo. De repente aparecias tu, em imagens saborosas e românticas e procuravas puxar-me por um braço, incentivavas-me a dar aquele último e derradeiro passo e dizias por entre palavras entretidas em migalhas de amor, -vem, estou aqui à tua espera.

De repente o céu escureceu numa noite de breu sem fim e as nuvens descarregaram as águas inteiras de uma vida há muito armazenada e a enorme enxurrada que causou no rio, arrastou a ponte desfazendo-a como peças de “Lego” desmontadas, fazendo com que nem pilares ficassem de pé. Ainda me acenaste com a tua mãos do outro lado do rio, mas já nada havia a fazer. O único sítio por onde eu podia passar, tenha-se esfumado, num turbilhão imenso de águas revoltas e aí percebi tudo então.

O problema afinal, não estava em passar a ponte para o outro lado mais uma vez. Desta vez, se eu tivesse passado a ponte nunca mais poderia retornar ao outro lado da minha vida. Aquela vida de tantos anos sossegada, de rotinas criadas, de horas vividas ao sabor dos ventos e das marés, afinal era por aí que eu tinha hesitado. Era isso que o meu subconsciente me avisava. Pronto, fiquei deste lado, agora só preciso fazer o mais difícil…esquecer o teu sorriso,Deixar de ouvir a tua voz suave nos meus ouvidos e, simplesmente esperar que o tempo passe e apague as memórias. Será que fiz bem? Claro que não…